domingo, 11 de abril de 2010

Sete alegrias de Maria

A tradição cristã forjou, no correr dos séculos, a imagem das “7 dores” e “7 alegrias” de Maria. O número 7 é inspirador. Evoca perfeição, completude. O sete evoca dois símbolos: 3 + 4. Para nós, o “três” sinaliza a unidade na diversidade (a trindade), enquanto que o quatro faz lembrar a abrangência do mundo e os quatro elementos básicos (água, terra, energia, ar). Felizmente, não existe nenhuma definição sobre o número e a denominação das dores e das alegrias de Maria. Portanto, a tradição viva da Igreja pode modificar, com liberdade, esta lista.
Há uma conjugação bela entre “dores” (ou tristezas) e “alegrias”. Todo ser humano, na medida em que faz uma opção de vida e persevera nela, enfrenta oposição e passa por dificuldades. Assim aconteceu também com Maria. Por outro lado, quem escolhe o caminho do Bem, mesmo que siga um caminho pedregoso, experimenta belos momentos de consolo, prazer, contentamento e confirmação interior. A pessoa, que se faz aprendiz da vida, aprende tanto com as alegrias quanto com as dores.
No entanto, a tradição católica deu muito mais ênfase às dores de Maria do que às suas alegrias. É momento de resgatar com intensidade as suas alegrias. A partir dos Evangelhos, lidos com o olhar de hoje, podemos identificar ao menos sete alegrias de Maria.

(1) O contentamento na anunciação (Lc 1,26): A primeira palavra dirigida a Maria é exatamente esta. O anjo de Deus a convida a alegrar-se em Deus. Aliás, todo o relato da infância em Lucas está encharcada por este sentimento de alegria. Quando o messias vem, o povo se alegra. Maria prova uma imensa alegria ao receber o convite de Deus. Sente-se de fato agraciada e envolvida num convite encantador.

(2) A alegria do encontro com Isabel: Maria se dirige às pressas para visitar sua parenta. Quando se encontram, Isabel é tomada de euforia. Proclama que Maria é “bendita entre as mulheres”, título no qual ecoa a participação de Maria no projeto salvífico de Deus. Que cena linda a ser contemplada: o encontro das duas mulheres, o cuidado cotidiano de uma com a outra, os sonhos e as esperanças em torno ao filho que vai nascer. Maria experimenta a alegria de ser missionária, de partilhar seu tempo e suas energias com alguém que necessita de proteção e ajuda. De fato, há mais alegria em dar do que em receber!

(3) O cântico alegre de Maria: Lucas coloca nos lábios do Maria um belo cântico, durante a visita a Isabel. Este canto de louvor de Maria foi chamado de “Magnificat”, primeira palavra da sua tradução latina, que significa “engrandecer”, ou “cantar as maravilhas”. Maria está cheia do Espírito Santo e proclama as grandezas de Deus na sua história pessoal e na história de seu povo. É um cântico de alegria e de consciência profética. Maria nos ensina a exercitar a ação de graças, a reconhecer e a proclamar com alegria os sinais de Deus na existência pessoal e nas práticas coletivas.

(4) O nascimento de Jesus: Lucas nos diz que o nascimento de Jesus foi motivo de alegria para todo o povo, a começar dos mais pobres, representados pelos pastores. Há alegria no céu e na terra! Todas as pessoas do Bem sentem-se amados por Deus, no momento em que o Filho assume a natureza humana. Maria participa desta alegria de maneira única, como protagonista. Ela é a mãe do filho de Deus encarnado. Gerou, gestou e deu à luz à Jesus. O natal é festa de alegria!

(5) Alegria na missão de Jesus: Pouca gente descobriu este contentamento especial que Maria provou, ao ver seu filho anunciar o Reino de Deus, curar os doentes, acolher os pobre e marginalizados, formar os discípulos e discípulas. Esta alegria não está descrita nos evangelhos, a não ser na cena de Caná. Maria e os discípulos experimentam um imenso prazer, quando percebem que Jesus é o vinho novo! Ele realiza as grandes esperanças de seu povo. Quanta alegria Maria viveu, ao acompanhar a missão de seu filho, como a perfeita discípula!

(6) Euforia da ressurreição: Depois de viver a decepcionante e trágica experiência da morte de Cruz, Maria e os seguidores de Jesus provaram uma alegria sem par. Jesus está vivo! Ele nos dá a paz. Ele venceu a morte! A ressurreição fez a comunidade de Jesus compreender que este Homem de Nazaré é o Filho de Deus! Com este novo olhar, compreenderam tantas coisas que Jesus fez e disse. Maria participa da ressurreição de Jesus de forma original: refaz lembranças, ilumina fatos, nutre sua fé, está presente como mãe da comunidade.

(7) Alegria de Pentecostes: O mesmo Espírito de Deus, que fecundou Maria e acompanhou Jesus, agora fecunda a comunidade cristã. Cria a comunhão na diversidade, reúne o novo Povo de Deus para além das fronteiras do judaísmo. Maria, que junto com outras mulheres e os familiares de Jesus, esteve em oração com os onze discípulos, acompanha a comunidade de forma discreta. É o tempo da história! A alegria de Maria e dos outras seguidores de Jesus se transforma na nossa alegria.

Ao percorrer as sete alegrias de Maria, cada cristão se reconhece nelas. Nossa vida de fé está marcada por estes sinais de Deus que nos consolam, nos fortalecem e nos estimulam. Com Maria, cantamos alegres: “O Senhor fez em nós maravilhas, Santo é o seu nome”.

Ir. Afonso Murad

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Maria das dores

A tradição católica enfatiza na semana santa as “Dores de Maria”. Recorda o sofrimento da mãe de Jesus ao ver o filho percorrer o triste caminho do calvário. Em algumas regiões do Brasil, faz-se na quarta-feira santa a “procissão do encontro”. Os homens vêem em procissão com a imagem de Jesus, e as mulheres, com a estátua de Maria. Com o nome sugere, os dois grupos se encontram ao final, para celebrar o trágico momento no qual Maria e Jesus convergem na trilha pública que o leva à morte.
Na sexta-feira da paixão multiplicam-se as vias sacras, os teatros da “paixão do Senhor”, na qual o drama encontra seu ápice na cena da cruz. Lá está Jesus, à beira da morte, acompanhado pelos dois ladrões (o bom e o maldoso), Maria e o discípulo amado. E, por fim, a terrível cena da “pietà”, na qual Maria sustenta nos braços o corpo morto de Jesus. Ao menos três dores do Maria no mesmo dia.
Maria, a mãe de Jesus, provavelmente viveu tal sofrimento, também partilhado pelos discípulos. A devoção popular, estimulada pelo clero e pelas correntes maximalistas, viu nestas cenas o fundamento de “Maria corredentora”. A idéia era muito simples. Dizia-se que Jesus nos salvou pela intensidade de seu sofrimento na cruz. Por isso, quanto mais sangue e mais sofrimento, maior seria a redenção. E Maria, como sofreu com Jesus na cruz, participou deste processo como ninguém, padecendo com seu coração de mãe.

Esta forma de refletir sobre as dores de Maria capta algo real: a solidariedade no sofrimento. Maria, a serva de Deus, está em profunda sintonia com Jesus, o Servidor da Humanidade, aquele no qual a comunidade cristã viu realizada a profecia do “Servo Sofredor”, anunciado por Isaías. Mas a reflexão deixa na sombra algo vital. A redenção trazida por Jesus não se realizou somente devido à morte na cruz. A salvação, oferecida em Jesus, é um longo processo. Começa na noite de natal, com a encarnação. Acontece em cada gesto de Jesus, quando anuncia o Reino de Deus, cura, inclui os pobres e pecadores, e fala do Pai. O gesto salvífico encontra seu ápice na cruz, expressão máxima do amor, a ponto de dar a vida. E só encontra sua plena compreensão à luz da ressurreição. Por isso, é mais correto afirmar que Jesus nos salva pelo seu nascimento, pela sua vida, pela sua morte e pela ressurreição.
Maria faz parte dessa história salvífica de forma especial. É a mãe de Jesus, personagem importante no mistério da encarnação. Em certo momento da vida, compreende o apelo de Jesus e se põe humildemente no caminho de seguidora. É aquela que realiza o perfil do discípulo: escuta a palavra, guarda no coração e a frutifica. E, no momento da cruz, é perseverante na fé. Por fim, participa com a comunidade de Jesus da alegria da sua ressurreição e do dom do Espírito.
É importante ver todo o trajeto da vida de Maria, junto a Jesus e seus discípulos. Não somente o momento da morte de cruz.
Precisamos compreender o lugar de Maria junto a Jesus e à sua comunidade, que hoje somos nós. Com ela, seguimos silenciosos o caminho de Jesus do calvário, até a cruz. Com ela também cantamos vibrantes a alegria da ressurreição. Aleluia!