quinta-feira, 13 de maio de 2021

Mensagem atual de Fátima

Há mais de cem anos, no dia 13 de maio de 1917, três pastorzinhos, Jacinta, Lúcia e Francisco, fazem uma experiência espiritual ímpar, de ver Maria glorificada e escutar suas mensagens. As aparições acontecem em maio, junho, julho, agosto e outubro. A última em outubro. Somente cinco vezes.

O núcleo da mensagem das aparições nós poderíamos dizer que hoje em dia consiste  na simplicidade, na conversão e na oração. Três aspectos essenciais. 

(1) A busca da simplicidade de vida, que se traduziu na piedade, na honestidade e na transparência das crianças. 

(2) O apelo à conversão. E hoje em dia quantos apelos de conversão nós precisamos realizar! O Papa Francisco na “Alegria do Evangelho” falava da conversão pastoral da Igreja, uma Igreja em saída, em diálogo com o mundo contemporâneo, que vai ao encontro daqueles e daquelas que mais precisam. Depois ele falou de uma conversão ecológica, tema esse já abordado por João Paulo II, ou seja, nós mudarmos nossa mente, nosso coração, nossas atitudes em relação a nossa Casa Comum. Passar da atitude de dominador e dominadora para aquela de irmão e de irmã.  

(3) A oração. Sintonizar-se com Deus, sintonizar-se com a humanidade que hoje sofre com a Covid-19 e a recomendação especial que os videntes receberam de Maria, para rezarem o rosário.

Além disso, vale citar: a presença materna de Maria, o apelo à paz e o convite à penitência. 

Hoje nós precisamos tomar estes aspectos da mensagem de Fátima e traduzi-los de uma maneira nova, porque já se passaram mais de cem anos. Portanto, me parece equivocado ficar repetindo mensagens que, às vezes, já tiveram sua validade e hoje precisam ser ampliadas. 

E um alerta! Cuidado com os sites e publicações que usam o nome de Nossa Senhora de Fátima para se colocar contra o Papa Francisco, contra a CNBB e para afrontar, de uma maneira indelicada e até vergonhosa, as ações sociais que se desempenham em favor dos pobres e da ecologia. Isso não é ser fiel à mensagem de Fátima. 

Então acolhamos com alegria a boa nova de Fátima. Que Maria venha ao nosso encontro, com carinho, com afeto neste mês de maio e compreendamos que ela sempre nos leva a Jesus. Essa é mensagem de Fátima, essa é a mensagem de Maria de Nazaré que está na Bíblia. Vamos seguir a Jesus com alegria, com espírito de companheirismo e colaboração. Maria vai junto com a gente, como mãe bondosa! 

quarta-feira, 12 de maio de 2021

Companheira de José e mãe de Jesus: Maria no Evangelho de Mateus

Cada evangelista, inspirado pelo Espírito Santo, apresenta para nós a pessoa e a missão de Jesus de maneira própria, considerando a vivência da fé na comunidade onde participa. Mateus, cobrador de impostos, se tornou seguidor de Jesus. Sua comunidade era constituída em grande parte por judeus convertidos ao cristianismo. Ele mostra que o Nazareno é o ungido de Deus, o messias esperado pelo povo que realiza as promessas de Deus. O novo Moisés, que substitui a lei antiga pelas Bem-Aventuranças e o sermão da Montanha (Mt 5-7). 

Na narração da infância de Jesus, Mateus destaca a figura de José, mais do que Maria. José recebe o anúncio do anjo de que sua noiva concebeu do Espírito Santo e então a acolhe como sua esposa (Mt 1,18-24). Ele faz um gesto desprendido de adotar Jesus como seu filho (Mt 1,16). Desde o começo, Jesus é rejeitado pelos poderosos de seu tempo. Os chefes dos sacerdotes de Jerusalém “ficam abalados”, mas nem se mexem para visitar o messias (Mt 2,3-4). Herodes, o rei estrangeiro que domina a nação em nome dos romanos, quer eliminá-lo e ordena a matança de muitas crianças (2,13). Nesse contexto de tanta indiferença e violência, surgem os reis magos. São eles que saem de sua terra para visitar o menino Jesus. Maria e José devem ter ficados surpresos e contentes quando receberam esses estrangeiros e viram os presentes que eles trouxeram.

José protege sua mulher e cuida de seu filho. Como um homem atento e providente, foge da Palestina com eles para evitar o assassinato de Jesus bebê (Mt 2,13-14). Tempos depois, volta com Maria e o menino para Nazaré da Galiléia (Mt 2,21-22). Podemos imaginar, a partir desses relatos tão simples e singelos, o amor que envolve José, Maria e Jesus. Há carinho, atenção e cuidado entre Maria e José, companheiros fiéis por toda a vida. Há afeto para Jesus, dando-lhe as condições biológicas e afetivas para ele se desenvolver. Maria e José viveram juntos a missão de educar Jesus. Ensinaram-lhe a falar, a andar, a amar e ser amado. Para Mateus, Maria é a companheira de José e a mãe de Jesus. E cumpre um importante papel no início de sua vida.

Quando Jesus se torna adulto, José provavelmente já havia morrido. Então, Jesus deixa sua família e seus parentes e parte em missão. O início não foi fácil, e devem ter surgido conflitos com os parentes. E há motivos. Para anunciar o Reino de Deus com liberdade, Jesus começa uma nova família. Não mais aquela ligada aos laços de sangue, mas sim a de seus seguidores, que se empenham em realizar a vontade do Pai (Mt 12,46-50). Como Maria reagiu a esta atitude de Jesus? Como ela percebeu que o Jesus adulto, mestre das multidões e messias do Novo Povo de Deus, pedia uma outra forma de presença? Essa pergunta será respondida  por Lucas. Veja mais artigos nesse blog. 

sexta-feira, 19 de março de 2021

Viva José de Nazaré!


Meditemos mais duas características de José de Nazaré, apresentadas pelo Papa Francisco na Carta Pastoral “Com Coração de Pai” (Patris Corde).

6. Pai trabalhador

Um aspeto que caracteriza São José é a sua relação com o trabalho. Era um carpinteiro que trabalhou honestamente para garantir o sustento da sua família. Com ele, Jesus aprendeu o valor, a dignidade e a alegria do que significa comer o pão fruto do próprio trabalho.

Neste nosso tempo em que o trabalho constitui uma urgente questão social e o desemprego atinge por vezes níveis impressionantes, mesmo em países onde se experimentou durante várias décadas um certo bem-estar, é necessário tomar renovada consciência do significado do trabalho que dignifica e do qual o nosso Santo é patrono e exemplo.

O trabalho torna-se participação na própria obra da salvação, oportunidade para apressar a vinda do Reino, desenvolver as próprias potencialidades e qualidades, colocando-as ao serviço da sociedade e da comunhão. O trabalho torna-se uma oportunidade de realização para o próprio trabalhador(a) e sua família. Onde falte o trabalho, a família está mais exposta a dificuldades, tensões, fraturas e até mesmo à desesperada e desesperadora tentação da dissolução. Como poderemos falar da dignidade humana sem nos empenharmos por que todos, e cada um, tenham a possibilidade dum digno sustento?

A pessoa que trabalha, seja qual for a sua tarefa, colabora com o próprio Deus, torna-se em certa medida criadora do mundo que a rodeia. A crise do nosso tempo, que é económica, social, cultural e espiritual, constitui um apelo a redescobrir o valor, a importância e a necessidade do trabalho para dar origem a uma nova «normalidade», em que ninguém seja excluído.

O trabalho de São José lembra-nos que o próprio Deus feito homem valorizou o trabalho. A perda de trabalho que afeta tantos irmãos e irmãs e tem aumentado nos últimos meses devido à pandemia de Covid-19, deve ser um apelo a revermos as nossas prioridades. Peçamos a São José Operário que encontremos vias onde possamos nos comprometer até se dizer: nenhum jovem, nenhuma pessoa, nenhuma família sem trabalho!

7. Pai na sombra

O escritor polaco Jan Dobraczyński, no seu livro A Sombra do Pai, narrou a vida de São José em forma de romance. Com essa sugestiva imagem, apresenta a figura de José, que é, para Jesus, a sombra na terra do Pai celeste: guarda-O, protege-O, segue os seus passos sem nunca se afastar d’Ele. Lembra o que Moisés dizia a Israel: «Neste deserto (…) vistes o Senhor, vosso Deus, conduzir-vos como um pai conduz o seu filho, durante toda a caminhada que fizeste até chegar a este lugar» (Dt 1, 31). Assim José exerceu a paternidade durante toda a sua vida.

Não se nasce pai, torna-se tal... E não se torna pai, apenas porque se colocou no mundo um filho, mas porque se cuida responsavelmente dele. Sempre que alguém assume a responsabilidade pela vida do outro, em certo sentido exercita a paternidade a seu respeito. Na sociedade atual, muitas vezes os filhos parecem ser órfãos de pai. A própria Igreja de hoje precisa de pais. Ser pai significa introduzir o filho na experiência da vida, na realidade. Não segurá-lo, nem prendê-lo, nem subjugá-lo, mas torná-lo capaz de opções, de liberdade, de partir. O amor que quer possuir, acaba sempre por se tornar perigoso: prende, sufoca, torna infeliz. O próprio Deus amou o homem deixando-o livre inclusive de errar e opor-se a Ele. A lógica do amor é sempre uma lógica de liberdade, e José soube amar de maneira extraordinariamente livre. Nunca se colocou a si mesmo no centro; soube descentralizar-se, colocar Maria e Jesus no centro da sua vida.

A felicidade de José não se situa na lógica do sacrifício de si mesmo, mas na lógica do dom de si mesmo. Naquele homem, nunca se nota frustração, mas apenas confiança. O seu silêncio persistente não inclui lamentações, mas sempre gestos concretos de confiança. O mundo precisa de pais, rejeita os dominadores. Isto é, rejeita quem quer usar a posse do outro para preencher o seu próprio vazio; rejeita aqueles que confundem autoridade com autoritarismo, serviço com servilismo, confronto com opressão, caridade com assistencialismo, força com destruição.

Toda verdadeira vocação nasce do dom de si mesmo, que é a maturação do simples sacrifício. Mesmo no sacerdócio e na vida consagrada, requer-se este género de maturidade. Quando uma vocação matrimonial, celibatária ou virginal não chega à maturação do dom de si mesmo, detendo-se apenas na lógica do sacrifício, então, em vez de significar a beleza e a alegria do amor, corre o risco de exprimir infelicidade, tristeza e frustração.

A paternidade, que renuncia à tentação de decidir a vida dos filhos, sempre abre espaços para o inédito. Cada filho traz sempre consigo um mistério, algo de inédito que só pode ser revelado com a ajuda dum pai que respeite a sua liberdade. Um pai sente que completou a sua ação educativa e viveu plenamente a paternidade, quando vê que o filho se torna autónomo e caminha sozinho pelas sendas da vida. Quando se coloca na situação de José, que soube que aquele Menino não era seu: fora simplesmente confiado aos seus cuidados. No fundo, é isto mesmo que dá a entender Jesus quando afirma: «Na terra, a ninguém chameis “Pai”, porque um só é o vosso “Pai”, aquele que está no Céu» (Mt 23,9).

Todas as vezes que nos encontramos na condição de exercitar a paternidade, devemos lembremos que não é exercício de posse, mas «sinal» que remete para uma paternidade mais alta. Em certo sentido, estamos sempre todos na condição de José: sombra do único Pai celeste, que «faz com que o sol se levante sobre os bons e os maus, e faz cair a chuva sobre os justos e os pecadores» (Mt 5,45); e sombra que acompanha o Filho.

Ao terminar a leitura dessas sete características de José de Nazaré: o que elas inspiram a sua vida cristã, no seguimento de Jesus?





quinta-feira, 18 de março de 2021

José de Nazaré: Acolhimento e coragem criativa

 

Meditemos  hoje mais duas três características de José de Nazaré, apontadas pelo Papa Francisco na Carta Apostólica “Com o coração de Pai” (Patris Corde).

4. Pai no acolhimento

José acolhe Maria, sem colocar condições prévias. Confia nas palavras do anjo. «Neste mundo onde é patente a violência psicológica, verbal e física contra a mulher, José apresenta-se como figura de homem respeitoso, delicado que, mesmo não dispondo de todas as informações, se decide pela honra, dignidade e vida de Maria. E, na sua dúvida sobre o melhor a fazer, Deus ajudou-o a escolher iluminando o seu discernimento».

Na nossa vida, muitas vezes sucedem coisas, cujo significado não entendemos. E a nossa primeira reação, frequentemente, é de desilusão e revolta. Diversamente, José deixa de lado os seus raciocínios para dar lugar ao que sucede e, por mais misterioso que possa aparecer a seus olhos. Acolhe-o, assume a sua responsabilidade e reconcilia-se com a própria história. Se não nos reconciliarmos com a nossa história, não conseguiremos dar nem mais um passo, porque ficaremos sempre reféns das nossas expectativas e consequentes desilusões.

A vida espiritual que José nos mostra, não é um caminho que explica, mas um caminho que acolhe. Só a partir deste acolhimento, desta reconciliação, é possível intuir também um significado mais profundo. José não é um homem resignado passivamente. O seu protagonismo é corajoso e forte.

O acolhimento é um modo pelo qual se manifesta, na nossa vida, o dom da fortaleza que nos vem do Espírito Santo. Só o Senhor nos pode dar força para acolher a vida como ela é, aceitando até mesmo as suas contradições, imprevistos e desilusões. A vinda de Jesus ao nosso meio é um dom do Pai, para que cada um se reconcilie com a carne da sua história, mesmo quando não a compreende totalmente.

O que Deus disse ao nosso Santo – «José, Filho de David, não temas…» (Mt 1, 20) –, parece repetir a nós também: «Não tenhais medo!» É necessário dar lugar àquilo que não escolhemos e, todavia, existe. Acolher a vida desta maneira introduz-nos num significado oculto. A vida de cada um de nós pode recomeçar miraculosamente, se encontrarmos a coragem de a viver segundo aquilo que nos indica o Evangelho. E não importa se tudo parece ter tomado já uma direção errada, e se algumas coisas já são irreversíveis. Deus pode fazer brotar flores no meio das rochas. E mesmo que o nosso coração nos censure de qualquer coisa, Ele «é maior que o nosso coração e conhece tudo» (1 Jo 3, 20).

A realidade, na sua misteriosa persistência e complexidade, é portadora dum sentido da existência com as suas luzes e sombras. É isto que leva Paulo a dizer: «Sabemos que tudo contribui para o bem daqueles que amam a Deus» (Rm 8, 28). E Santo Agostinho acrescenta: tudo, «incluindo aquilo que é chamado mal». Nesta perspectiva global, a fé dá significado a todos os acontecimentos, sejam eles felizes ou tristes. Crer não significa encontrar fáceis soluções consoladoras. Antes, pelo contrário, a fé que Cristo nos ensinou é a que vemos em São José, que não procura atalhos, mas enfrenta de olhos abertos aquilo que lhe acontece, assumindo pessoalmente a responsabilidade por isso.

O acolhimento de José convida-nos a receber os outros, sem exclusões, tal como são, reservando uma predileção especial pelos mais frágeis, porque Deus escolhe o que é frágil (cf. 1 Cor 1, 27), é «pai dos órfãos e defensor das viúvas» (Sal 68, 6) e manda amar o forasteiro. Posso imaginar ter sido do procedimento de José que Jesus tirou inspiração para a parábola do filho pródigo e do pai misericordioso (cf. Lc 15, 11-32).

5. Pai com coragem criativa

Se a primeira etapa de toda cura interior é acolher a própria história, ou seja, dar espaço no nosso íntimo até mesmo àquilo que não escolhemos na nossa vida, convém acrescentar outra caraterística importante: a coragem criativa. Esta vem sobretudo quando se encontram dificuldades. Então, podemos ficar imobilizados, abandonar o campo, ou tentar vencê-las de algum modo. Às vezes, são precisamente as dificuldades que fazem sair de cada um de nós recursos que nem pensávamos ter.

Ao ler os «Evangelhos da Infância de Jesus» (Lc 1-2; Mt 1-2), perguntamos: por que motivo Deus não age de forma direta e clara? Deus intervém por meio de acontecimentos e pessoas: José é o homem por meio de quem Deus cuida dos inícios da história da redenção; é o verdadeiro «milagre», pelo qual Deus salva o Menino e sua mãe. O Céu intervém, confiando na coragem criativa deste homem que, tendo chegado a Belém e não encontrando alojamento onde Maria possa dar à luz, arranja um estábulo e prepara-o de modo a tornar-se o lugar mais acolhedor possível para o Filho de Deus que vem ao mundo (cf. Lc 2, 6-7). Face ao perigo iminente de Herodes, que quer matar o Menino, de novo em sonhos José é alertado para O defender e, no meio da noite, organiza a fuga para o Egito (cf. Mt 2, 13-14).

Parece que o mundo está à mercê dos fortes e poderosos. Mas a «boa notícia» do Evangelho consiste precisamente em mostrar como, não obstante a arrogância e a violência dos dominadores terrenos, Deus encontra sempre a forma de realizar o seu plano de salvação. Às vezes também a nossa vida parece à mercê dos poderes mais fortes, mas o Evangelho nos diz que Deus consegue sempre salvar aquilo que conta, desde que usemos a mesma coragem criativa do carpinteiro de Nazaré. Ele sabe transformar um problema em oportunidade, colocando sempre a sua confiança em Deus.

Se, em determinadas situações, parece que Deus não nos ajuda, isso não significa que nos tenha abandonado, mas que confia em nós com aquilo que podemos projetar, inventar, encontrar. Trata-se da mesma coragem criativa demonstrada pelos amigos do paralítico que, desejando levá-lo à presença de Jesus, fizeram-no descer pelo teto (Lc 5, 17-26). A dificuldade não deteve a audácia e obstinação daqueles amigos. Jesus reconhece a fé criativa com que aqueles homens procuram trazer-Lhe o seu amigo doente.

O Evangelho não diz quanto tempo Maria, José e o Menino permaneceram no Egito. Mas certamente tiveram de comer, encontrar uma casa, um emprego. Não é preciso muita imaginação para preencher o silêncio do Evangelho a tal respeito. A Sagrada Família teve que enfrentar problemas concretos, como todas as outras famílias, como muitos dos nossos irmãos migrantes que ainda hoje arriscam a vida, pressionados pelas desventuras e a fome. São José é padroeiro especial para os têm que deixar a sua terra por causa das guerras, do ódio, da perseguição e da miséria.

Em cada acontecimento que tem José como protagonista, ele se levanta toma consigo o Menino e sua mãe e faz o que Deus lhe pede (Mt 1,24; 2,14.21). Com efeito, Jesus e Maria são o tesouro mais precioso da nossa fé. No plano da salvação, o Filho não pode ser separado da Mãe, d’Aquela que «avançou pelo caminho da fé, mantendo fielmente a união com seu Filho até à cruz».

Sempre devemos interrogar se estamos protegendo com todas as nossas forças Jesus e Maria, que misteriosamente estão confiados à nossa responsabilidade, ao nosso cuidado, à nossa guarda. O Filho do Todo-Poderoso vem ao mundo, assumindo uma condição de grande fragilidade. Necessita de José para ser defendido, protegido, cuidado e criado. Deus confia neste homem. Maria faz o mesmo: encontra em José aquele que não só Lhe quer salvar a vida, mas sempre a sustentará, a Ela e ao Menino. Neste sentido, São José não pode deixar de ser o Guardião da Igreja, porque a Igreja é o prolongamento do Corpo de Cristo na história e ao mesmo tempo, na maternidade da Igreja, espelha-se a maternidade de Maria. José, continuando a proteger a Igreja, continua a proteger o Menino e sua mãe; e também nós, amando a Igreja, continuamos a amar o Menino e sua mãe.

Este Menino é Aquele que dirá: «Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes» (Mt 25, 40). Assim, todo o necessitado, pobre, atribulado, moribundo, forasteiro, recluso, doente são «o Menino» que José continua a guardar. Por isso mesmo, São José é invocado como protetor dos miseráveis, necessitados, exilados, aflitos, pobres, moribundos. E pela mesma razão a Igreja não pode deixar de amar em primeiro lugar os últimos, porque Jesus conferiu-lhes a preferência ao identificar-Se pessoalmente com eles. De José, aprendendo o mesmo cuidado e responsabilidade: amar o Menino e sua mãe; amar os Sacramentos e a caridade; amar a Igreja e os pobres. Cada uma destas realidades é sempre o Menino e sua mãe.

quarta-feira, 17 de março de 2021

José de Nazaré: um pai com ternura

 

Papa Francisco aponta sete características da paternidade de José de Nazaré, chamado de “São José” pelos cristãos das Igrejas católica e ortodoxa. Resumo da Carta Apostólica “Com coração de Pai”.

17  de Março

Com coração de pai: assim José amou a Jesus, designado nos quatro Evangelhos como «o filho de José». Os dois evangelistas que puseram em relevo a sua figura, Mateus e Lucas, narram pouco, mas o suficiente para fazer compreender o género de pai que era e a missão que Deus lhe confiou.

(1) Um amado Pai

 A grandeza de São José consiste no fato de ter sido o esposo de Maria e o pai de Jesus. Por seu papel na história da salvação, São José é um pai amado pelo povo cristão. A ele foram dedicadas numerosas igrejas por todo o mundo; muitos institutos religiosos, confrarias e grupos eclesiais se inspiram na sua espiritualidade e adotam o seu nome.

A confiança do povo em São José está contida na expressão «vão a José», que faz referência ao período de carestia no Egito, quando o povo pedia pão ao Faraó e ele respondia: «Ide ter com José; fazei o que ele vos disser» (Gn 41, 55). Tratava-se de José, filho de Jacob, que acabara vendido, vítima da inveja dos seus irmãos (Gn 37, 11-28); e posteriormente tornou-se vice-rei do Egito (Gn 41, 41-44).

Enquanto descendente de David (Mt 1, 16.20) e como esposo de Maria de Nazaré, São José constitui a dobradiça que une o Antigo e o Novo Testamento.

2. Pai na ternura

Dia após dia, José via Jesus crescer «em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Deus e dos homens» (Lc 2, 52). Como o Senhor fez com Israel, assim ele ensinou Jesus a andar, segurando-O pela mão: era para Ele como o pai que levanta o filho contra o seu rosto, inclinava-se para Ele a fim de Lhe dar de comer (Os 11, 3-4).

Jesus viu a ternura de Deus em José: «Como um pai se compadece dos filhos, assim o Senhor Se compadece dos que O temem» (Sal 103, 13). Com certeza, José terá ouvido ressoar na sinagoga, durante a oração dos Salmos, que o Deus de Israel é um Deus de ternura, que é bom para com todos e «a sua ternura repassa todas as suas obras» (Sal 145, 9).

A história da salvação realiza-se, «na esperança para além do que se podia esperar» (Rm 4, 18), através das nossas fraquezas. Muitas vezes pensamos que Deus conta apenas com a nossa parte boa e vitoriosa, quando, na verdade, a maior parte dos seus desígnios se cumpre através e apesar da nossa fraqueza. Se esta é a perspectiva da economia da salvação, devemos aprender a aceitar, com profunda ternura, a nossa fraqueza.

A ternura é a melhor forma para tocar o que há de frágil em nós. Muitas vezes o dedo em riste e o juízo que fazemos a respeito dos outros são sinal da incapacidade de acolher dentro de nós mesmos a nossa própria fraqueza, a nossa fragilidade. Só a ternura nos salvará da obra do Acusador (Ap 12, 10). Deus não nos condena, mas acolhe-nos, abraça-nos, ampara-nos, perdoa-nos. Apresenta-se sempre como o Pai misericordioso da parábola (Lc 15, 11-32): vem ao nosso encontro, devolve-nos a dignidade, levanta-nos, ordena uma festa para nós, dando como motivo que «este meu filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi encontrado» (Lc 15, 24).

A vontade de Deus, a sua história e o seu projeto passam também através da angústia de José. Assim ele nos ensina que ter fé em Deus inclui também acreditar que Ele pode intervir inclusive através dos nossos medos, das nossas fragilidades, da nossa fraqueza. No meio das tempestades da vida, não devemos ter medo de deixar a Deus o timão da nossa barca. Por vezes queremos controlar tudo, mas o olhar d’Ele vê sempre mais longe.

3. Pai na obediência

De forma parecida a quanto fez com Maria, manifestando-Lhe o seu plano de salvação, Deus revelou a José os seus desígnios por meio de sonhos, que na Bíblia, como em todos os povos antigos, eram considerados um dos meios pelos quais o Senhor manifesta a sua vontade.

Por sua vez, o evangelista Lucas refere que José enfrentou a longa e incómoda viagem de Nazaré a Belém, devido à lei do imperador César Augusto relativa ao recenseamento, que impunha a cada um registar-se na própria cidade de origem. E foi precisamente nesta circunstância que nasceu Jesus (cf. 2, 1-7), sendo inscrito no registo do Império, como todos os outros meninos.

Em todas as circunstâncias da sua vida, José soube pronunciar o seu «fiat» (faça-se!), como Maria na Anunciação e Jesus no Getsémani. Na sua função de pai de família, José ensinou Jesus a ser obediente aos pais (Lc 2, 51), segundo o mandamento de Deus (Ex 20, 12).

Ao longo da vida oculta em Nazaré, na escola de José (e de Maria), Jesus aprendeu a fazer a vontade do Pai. Tal vontade torna-se o seu alimento diário (cf. Jo 4, 34). Mesmo no momento mais difícil da sua vida, vivido no Getsémani, preferiu que se cumprisse a vontade do Pai, e não a sua, fazendo-Se «obediente até à morte de cruz» (Flp 2, 8). Por isso, o autor da Carta aos Hebreus conclui que Jesus «aprendeu a obediência por aquilo que sofreu» (5, 8).

Então, «José foi chamado por Deus para servir diretamente a Pessoa e a missão de Jesus, mediante o exercício da sua paternidade: desse modo, precisamente, ele coopera no grande mistério da Redenção, quando chega a plenitude dos tempos, e é verdadeiramente ministro da salvação».


terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Apresentação: Maria oferece seu dom mais precioso

O evangelista Lucas nos conta que quando Jesus ainda era um bebê, com quase dois meses de vida, Maria e José foram ao templo de Jerusalém apresenta-lo Deus (Lc 2,21-38). Trata-se de um ritual do judaísmo, no qual o primeiro filho (primogênito) era consagrado ao Senhor. Esse gesto tão simples foi vivido por Maria e José com intensidade e inteireza. A ida ao templo significou a consagração comunitária deles a Deus. Eles assumiram a missão de amar e educar Jesus. E acompanhar seu desenvolvimento humano e espiritual, até que ele se tornasse adulto. 

Ao mesmo tempo que Maria oferece Jesus ao Pai, ele também se oferece. Renova o seu “sim”, pronunciado na anunciação: “eis aqui a servidora do Senhor! Faça-se em mim segundo a Sua palavra” (Lc 1,18). Eis aí o seu dom, o mais precioso. No canto de ofertório da missa “Maria, mãe da Igreja”, se diz: “Sobe a Jerusalém, virgem oferente sem igual. Vai, apresenta ao Pai teu menino, luz que chegou no Natal”. E o final, proclama: “culto agradável a Deus é fazer a oferta do próprio coração”. Assim fez Maria.

Os pais se encantam com as crianças recém-nascidas. Cada movimento novo, cada descoberta, cada novo gesto, como dar um sorriso, reconhecer seu nome, mexer as mãos e os pés, é saboreado. Se você é pai ou mãe, avô ou avó, sabe como um bebê desperta em nós profundos sentimentos de cuidado, de atenção e também de preocupação. Ele vai crescer com saúde? O que será dessa criança? O que o futuro lhe reserva? Maria também deve ter provado esses sentimentos. Então, na apresentação ela reafirma sua confiança em Deus, para vencer o medo. E há motivos para temer. 

No templo, Maria e José encontram o velho Simeão, que toma o bebê nos braços, louva a Deus e anuncia profeticamente que Jesus será o salvador de todos os povos. Mas, atenção! Ele também vai provocar conflitos. E a própria Maria vai sofrer com isso (Lc 2,33-35). Simeão abençoa o jovem casal! Como essa bênção foi bem-vinda, pois é a força de Deus que atua na gente. Por fim, Maria e José encontram a profetiza Ana, também idosa e sábia, que dá graças a Deus pelo nascimento de Jesus, o futuro libertador do povo (Lc 2,36-38).

Quando celebramos a festa de Apresentação, no dia 2 de fevereiro, recordamos o gesto de José e de Maria, de se oferecerem totalmente a Deus, para amar, educar e acompanhar Jesus. Também nós somos convidados a renovar a nossa consagração a Deus e a seguir Jesus com intensidade e inteireza. Amém.

segunda-feira, 23 de novembro de 2020

A mensagem atual de Aparecida

O Papa Francisco, em carta aos bispos da América Latina em 2017, diz que Aparecida é uma escola para aprender a seguir Jesus. E ele destaca três características.

(1) Os pescadores: são pessoas para encaram o dia a dia, enfrentando a incerteza do rio. Vivem com a insegurança de não saber qual seria o “ganho” do dia. Eles conhecem tanto a generosidade do rio, quanto a agressividade das águas nas enchentes. Acostumados a enfrentar os desafios da vida com teimosia, não deixam de lançar as redes. Esta imagem nos aproxima do centro da vida de tantos irmãos nossos. Pessoas que, desde cedo até a noite, saem para ganhar a vida, sem saber qual será o resultado. O que mais dói é ver que enfrentam a dureza gerada por um dos pecados mais graves do nosso Continente: a corrupção. Essa corrupção que arrasa com vidas, mergulhando-as na mais extrema pobreza. Corrupção que destrói populações inteiras, submetendo-as à precariedade. Como um câncer, vai corroendo a vida cotidiana de nosso povo. E aí estão tantos irmãos nossos que, de maneira admirável, saem para lutar contra este flagelo. 

(2) A Mãe. Maria conhece bem a vida de seus filhos.  Está atenta e acompanha a vida deles. Maria “vai onde não é esperada. No relato de Aparecida, nós a encontramos no meio do rio, cercada de lama. Aí, espera seus filhos, está no meio de suas lutas e buscas. Não tem medo de mergulhar com eles nas situações difíceis da história e, se necessário, sujar-se para renovar a esperança”. Maria aparece onde os pescadores lançam as redes, ali onde as pessoas tentam ganhar a vida. Como mãe, está junto delas. 

(3) O encontro. As redes se encheram de uma presença que deu aos pescadores a certeza que eles não estavam sós em sua labuta. Era o encontro desses homens com Maria. Depois de limpar e restaurar a imagem, levaram-na a uma casa onde ela permaneceu um bom tempo. Nesse lar os pescadores da região iam ao encontro de Aparecida. “E essa presença se fez comunidade, Igreja. As redes não se encheram de peixes, se transformaram em comunidade”. 

Em Aparecida, encontramos um povo forte e persistente. Consciente que suas redes, sua vida, está cheia da presença Maria, que o anima a não perder a esperança. Uma presença que se esconde no cotidiano, nesses silenciosos espaços nos quais o Espírito Santo continua sustentando nosso Continente. Tudo isto nos apresenta sua mensagem, que devemos acolher.

Para terminar, Francisco nos diz: “viemos como filhos e como discípulos para escutar e aprender o que hoje, 300 anos depois, este acontecimento continua nos dizendo. Aparecida não nos traz receitas, mas chaves, critérios, pequenas grandes certezas para iluminar”. E sobretudo, acender o desejo de voltar ao essencial da nossa fé. Amém!